sexta-feira, 3 de abril de 2020

Mulheres Negras: moldando a teoria feminista


Cecília Braz Arcanjo


(A partir da leitura do capítulo 1 do livro Teoria feminista, de bell hooks)


bell hooks inicia seu livro Teoria feminista: da margem ao centro convocando-nos a refletir sobre o movimento feminista atual. Apesar de ser um livro publicado pela primeira vez em 1984, é notável a atualidade da discussão que a autora nos traz.
A partir da análise do feminismo no contexto americano, o primeiro capítulo do livro enfatiza a exclusão das mulheres negras do movimento feminista, as quais são frequentemente colocadas à margem ou tendo suas lutas invisibilizadas pelas intelectuais (de certa forma detentoras dos conceitos feministas) à época. Afinal, as experiências sofridas pelas “esposas brancas instruídas” não podem ser traduzidas como a única forma de opressão pelas quais as mulheres passam. Essa “perspectiva unidimensional”, no entanto, tornou-se referência para a compreensão do feminismo, sem considerar que tais dramas, ainda que legítimos, provavelmente não são as principais referências no tocante à opressão que o sexismo impõe às mulheres na sociedade americana. Ao contrário, pertencem a um seleto, e muitas vezes privilegiado, grupo de mulheres.
bell hooks demonstra a capacidade do patriarcado capitalista dominante em cooptar as pautas feministas vigentes, desde que “mulheres que não se opunham ao patriarcado, ao capitalismo, à distinção de classes sociais ou ao racismo passaram a se intitular feministas”. Assim, se possuir como referência a perspectiva individual liberal, o movimento feminista não possuirá uma conotação coletiva, servindo como mais uma ferramenta para alimentar os interesses das classes dominantes.  
A autora traz relatos pessoais de sua experiência na faculdade, revelando seu sentimento de não pertencimento aos grupos feministas, pois “embora se mostrassem interessadas em nossos relatos pessoais sobre a experiência negra, agiam como se coubesse a elas decidir sobre a autenticidade dessas experiências”, contribuindo para silenciar as mulheres negras em espaços essencialmente tidos como feministas.
bell hooks nos faz refletir sobre a posição da mulher negra na sociedade, que está na base da pirâmide social, e como o feminismo tem falhado em reconhecer a importância de incluir no debate feminista as inter-relações entre as opressões de classe e raça. Para exemplificar as opressões, a autora aponta com propriedade a não existência de um “outro” que sirva de objeto de exploração às mulheres negras, ao passo que aos homens negros e às mulheres brancas existe: a possibilidade de agirem como opressores das mulheres negras, fazendo com que a luta feminista, assim como a racista, seja minada. Segundo a autora, “enquanto a igualdade almejada por esses dois grupos ou outro qualquer conceber a libertação como a conquista da igualdade social com homens brancos da classe dominante, eles continuarão exercendo opressão e exploração sobre terceiros”.
Finalizando o capítulo, a autora deixa claro o caminho ao qual o livro se dedicará, apontando como essencial que as mulheres negras reconheçam a vantagem de sua marginalidade, para que possam, a partir dessa perspectiva, manifestar críticas ao pensamento feminista dominante, no intuito de juntar esforços para a construção de uma teoria feminista libertadora e coletiva.
             

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